"Roçam a incontitucionalidade", escreve-se hoje em título na edição online de um jornal diário, a propósito do que também aí se designa por "restrições para os próximos dias". Dir-se-ia que dizer isso roça, ou vai mais longe, o eufemismo. Já agora:

Art. 21º

(Direito de resistência)

Todos têm o direito de resistir a qualquer ordem que ofenda os seus direitos, liberdades e garantias e de repelir pela força qualquer agressão, quando não seja possível recorrer à autoridade pública.

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Que fará um sr. guarda, ou um sr. agente, admitindo-se bondosamente que estamos num estado de direito, se pelos próximos dias lhes apresentar uma edição da CRP, lendo-lhes o texto deste artigo? E com ele o texto do 18º, do 19º e, antes mesmo destes, do 44º.

Art. 19°

(Suspensão do exercício de direitos)

1. Os órgãos de soberania não podem, conjunta ou separadamente, suspender o exercício dos direitos, liberdades e garantias, salvo em caso de estado de sítio ou de estado de emergência, declarados na forma prevista na Constituição.

(...)

Nada há no restante texto deste artigo que derrogue o disposto neste n°1. O Senhor Presidente da República é catedrático de direito. O Senhor Primeiro-Ministro terá sido um dos melhores alunos do Senhor Presidente da República. E uma resolução do conselho de ministros impera sobre uma norma constitucional.

Vale o que vale

"E eu pergunto a mim próprio (...) se a vida de algumas crianças e de algumas pessoas indefesas não vale bem, não justifica largamente, meia dúzia de safanões a tempo nessas criaturas sinistras...".

Palavras de 1932, de quem ainda hoje é o culpado apriorístico de todos os males da pátria e a quem são por estes dias liminarmente equiparados todos os que, não estando à sua esquerda, têm a disparatada ideia de contestar a actuação do sr. primeiro-ministro, sua equipa governamental e família partidária.

A propósito de se afirmar não se gostar de ser autoritário, sendo-o. 

Parece que se estreia hoje um novo modelo, mais suave, de incómodo parlamentar ao sr. primeiro-ministro e sua gente. Maçá-lo quinzenalmente era de facto intolerável, como até o sr. líder da oposição (suponho que o cargo não tem consagração formal por cá, mas aceite-se nem que por preguiça essa figura) concorda. À hora a que escrevo, uma senhora - que consta não vingou na representação teatral - perora, com a sábia dose de hipocrisia e teatralidade, criticando o que vai afinal sustentando.

A questão do Tribunal de Contas ficou entretanto resolvida. Diz mesmo o sr. primeiro-ministro que o ficou de acordo com um critério que vincula também o sr. presidente da república. É de crer que o tenha consultado antes de invocar esta precisão. Não se compreenderia, aliás, que o não fizesse.

Está tudo bem assim e não podia ser de outra forma. Alguém, em tempos, o disse.

Costa