Chamam-lhes provas de aferição e vão pôr criaturas de sete ou oito anos de idade, se bem percebo, a fazê-las em computadores. Está muito bem. Um pedaço de papel, nem que sejam os restos de uma página de jornal rasgada, e qualquer coisa que nela deixe um rasto - da luxuosa caneta ao mais humilde lápis; ao pedaço de carvão; ao rasto de sangue, como se sabe - pode muito facilmente tornar-se num perigosíssimo meio de rebelião. Saber escrever, saber manuscrever, saber fazê-lo de forma proficiente, legível, clara, e sem mais do que esses recursos, é portanto coisa muito perigosa.
Coisa de insuportável potencial subversivo, passível de se concretizar sem energia eléctrica, sem software e com hardware perigosamente básico, sem rede, sem palavras-passe, sem moderadores de costumes e opinião. Coisa por isso intolerável. As criancinhas que saibam martelar teclas e revelar o que lhes vai no pensamento, tendo-o, desde que sob forma que permita aos sacerdotes do que pode ser saber o que vai nesse pensamento. Não se lhes dê mais autonomia do que aquela que seja útil: a das obedientes competências e saberes, como se lhe chama por estes dias.
Saber escrever, encorajar esse poder de deixar uma ideia escorreita numa simples folha de papel, "à mão", mais do que ocioso nesta era encharcada de tecnologia e vigilantes de costumes, é perigoso.
É inaceitável.