Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Sobrevive-se

Sobrevive-se

30
Jun23

Empecilhos

Costa

"Por norma, os woke acham que a verdade é um escrúpulo de gente conservadora, um dispensável fait divers ou um empecilho e dano colateral da sua luta política." 

João Pedro Marques, hoje (com a devida vénia), no Observador. A assinatura deste mês está justificada.

08
Jun23

Pelintras pedantes.

Costa

Experienciando o que se experimentava e expectando o que se esperava, se vai gerenciando o que se ia gerindo. Cada vez mais.

Haverá quem lhe chame cosmopolitismo. Uma língua entregue a incultos pelintras pedantes, enfim.

27
Mai23

Demência dolosa

Costa

Demência dolosa no discurso de certa líder cessante de certa agremiação, esta manhã. Fundada largamente em factos que, de tão penosos e perenes, só outros dementes dolosos (os outros dementes dolosos de - longo - turno no poder) não reconhecerão ou desvalorizam. Assente na crença cega, fanatizada, maniqueísta, no dogma, da superioridade moral sobre todo e qualquer aspecto da vida; sobre todos os outros, os que ousam pensar diferente, infinita e fatalmente maus. 

Populismo, sim, isto, no pior sentido da palavra. 

O resto é o carinhoso tratamento que a coisa sempre mereceu da comunicação dita social. 

15
Mai23

Provas de aferição.

Costa

Chamam-lhes provas de aferição e vão pôr criaturas de sete ou oito anos de idade, se bem percebo, a fazê-las em computadores. Está muito bem. Um pedaço de papel, nem que sejam os restos de uma página de jornal rasgada, e qualquer coisa que nela deixe um rasto - da luxuosa caneta ao mais humilde lápis; ao pedaço de carvão; ao rasto de sangue, como se sabe - pode muito facilmente tornar-se num perigosíssimo meio de rebelião. Saber escrever, saber manuscrever, saber fazê-lo de forma proficiente, legível, clara, e sem mais do que esses recursos, é portanto coisa muito perigosa.

Coisa de insuportável potencial subversivo, passível de se concretizar sem energia eléctrica, sem software e com hardware perigosamente básico, sem rede, sem palavras-passe, sem moderadores de costumes e opinião. Coisa por isso intolerável. As criancinhas que saibam martelar teclas e revelar o que lhes vai no pensamento, tendo-o, desde que sob forma que permita aos sacerdotes do que pode ser saber o que vai nesse pensamento. Não se lhes dê mais autonomia do que aquela que seja útil: a das obedientes competências e saberes, como se lhe chama por estes dias.

Saber escrever, encorajar esse poder de deixar uma ideia escorreita numa simples folha de papel, "à mão", mais do que ocioso nesta era encharcada de tecnologia e vigilantes de costumes, é perigoso.

É inaceitável.

04
Mai23

É assim que deve ser.

Costa

A data - o que nela se assinala - jamais suscitaria, evidentemente, o menor estremecimento no povo. Não neste povo. Não com estes "governantes" e o seu desígnio de patriótico embrutecimento das massas (que adoram ser embrutecidas). Não com o que por cá haja de sucedâneo de uma elite cultural, ora cobarde, ora dependente, ora pura, canina e simplesmente vendida. E menos ainda, por óbvias razões, neste particular cinco de Maio de impune, incontinente, despudorada e desbragada farsa.

No Público de hoje, Nuno Pacheco lembra ser este o Dia Mundial da Língua Portuguesa. E evoca a língua portuguesa tal como por cá deveria ser falada e grafada (isto se por cá, entre povo e seus pastores, e com a excepção estupificante da bola, restasse um átomo de amor-próprio; pelo que de facto merece). Algo, essa correcta fala, pelo menos - e quanto ao resto conhece-se também o que pensa -, que o primeiro-ministro desta república, ainda muito recentemente, e como o texto recorda, parece solenemente lamentar:

https://www.publico.pt/2023/05/04/culturaipsilon/opiniao/lingua-ortografia-voluntarismos-bajulacoes-2048244

A coisa passará assim largamente, quase absolutamente, ignorada. Porque é assim que deve ser.

 





25
Abr23

Entregues a doid@s

Costa

Finda a liturgia do dia, uma ainda líder partidária achou por bem destacar, a voz quase embargada, das palavras do presidente da república o que ela tomou como a admissão (e, afirmou ela, apenas pecando por tardia) pela mais alta figura do estado, das nossas tremendas culpas, no tempo presente e jamais expiadas, pois que eternas e infinitas, pelo passado colonial português. 

O sr. presidente, haverá que convir, deu o flanco a esse estremecido, emocionado, êxtase masoquista assim revelado, ao vivo e em directo, a toda uma pátria sedenta de tanto saber. Ba decerto terá uma paternalista palavra de apreço para com a sua serva. Eu reforcei a certeza de que estamos, tudo visto há já mais tempo do que durou o terrível Estado Novo, entregues a doidos.

Ou a doid@s. 

19
Abr23

Por favor

Costa

"De momento, todos os nossos agentes encontram-se ocupados. Por favor aguarde. O tempo de espera pode ser superior a trinta minutos".

"Por favor", escuta-se na gravação, enquanto em fundo uma música - chame-se-lhe bondosamente assim -, medonha, arruína os nervos do mais estóico.

Vá lá, "por favor"; ao menos isso.

Ao menos isso, porque os prazos correm, imperturbavelmente, e o não atendimento tempestivo do cidadão, por parte da inimputável administração pública, não confere ao cidadão qualquer garantia.

Mas ou a administração pública funciona mal, muito mal, impunemente muito mal; ou a burocracia instalada - decerto em boa parte para justificar essa administração pública - é kafkianamente absurda, levando à saturação dos canais de contacto entre essa administração pública e o cidadão (perdão: o "contribuinte", "utente" ou "sujeito passivo", "cidadão" é que não se vê como), mesmo para tratar de questão menor; ou tudo isso é verdade.

Será isso: tudo isso é verdade. E o Soberano gosta que seja assim. 

 

03
Abr23

Da barbárie.

Costa

O culto da língua, escrita ou falada, é quase ausente, tido como anacronismo, inútil ociosidade de reaccionários: tudo se aceita, desde que se perceba o que se quer dizer (e mesmo esse critério vai falhando estrondosamente). O AO90, essa ignomínia, bem poderia ser o corolário do desastre, não fosse o facto da mais elementar prudência mandar não esquecer que quando se pensa ter batido no fundo, e com toda a probabilidade, se atravessa apenas, afinal, mais uma camada de lodo. Pior é sempre possível. 

É expectável ("expetável", na ortografia politicamente correcta), por estes dias, o que sempre foi de esperar; há que gerenciar, actualmente, o que de uso se geria; urge experenciar, nestes tempos, o que noutros se experimentaria. E outros modismos haverá. Que vantagem trazem? Quem - sejamos então inclusivos, como manda a regra vigente - empoderam. Uma legião de imbecis, decerto.

Os bárbaros às portas da Cidade.

25
Mar23

Dos gostos das massas.

Costa

É coisa já velha, de anteontem, na imprensa e não só, e não parece ter provocado o mais leve estremecimento nas massas e em quem as (nos) pastoreia. O que é, tudo visto, muito natural. O director nacional da PSP, elaborando sobre os requisitos de segurança de alguns jogos de futebol - o futebol profissional, essa escola de virtudes - disse, entre outras considerações assustadoras mas nada surpreendentes e como seu corolário, "... evitamos desastres todos os fins-de-semana. Assemelham-se a preparativos para uma guerra."

A coisa de facto não produziu qualquer comoção, dissipou-se sem mais, rapidamente, entre a abundância com que vamos sendo servidos, por exemplo, a propósito das culpas infindas dos grandes merceeiros nos males da pátria. Sendo assim certo que há uma guerra civil latente, por vezes mais do que latente, reiterada e metodicamente fomentada por figuras públicas e grupos tranquilamente acima da lei e com extraordinária importância junto da comunicação social, sedenta aliás destas coisas, essa é na verdade uma guerra civil muito útil. Muito útil desde logo para o poder. Que, de substantivo, nada faz para a debelar.

E as massas gostam disso. Genuinamente.

13
Mar23

Da passiva submissão.

Costa

Ensina-nos a república (deliberada inicial minúscula) que somos cidadãos. Cidadãos, essa expressão máxima de igualdade, de dignidade que séculos da vil condição de súbdito - esse horror monárquico -, ensina-nos, negaram. Cidadãos, desde esse momento alto de civilização, civilidade e respeito por um "due process" que foi a revolução francesa (e vou mantendo as iniciais minúsculas).

E um tipo conforma-se, tende a aceitar a coisa como boa, prefere até não pensar muito (não vá a sua consciência incomodá-lo insuportavelmente), aceita essa espécie de verdade. Habitua-se, vive com ela, enfim. Mesmo sabendo que o Leviatã não é exactamente, e usando de eufemismo, pessoa de bem.

Depois lá vem a cartinha das finanças. Uma cartinha das finanças na caixa do correio é o suficiente para desencadear sério fenómeno de arritmia (ou coisa afim: de médico só tenho o que têm os loucos). Um cidadão, digamos, comum, nunca está certo de estar em dia com os seus impostos, taxas e restantes obrigações fiscais. Nem que apenas declarativas. E sabendo-se que nem a presunção de inocência, esse sagrado - e seguramente republicano - princípio, se aplica perante o fisco e que, mesmo estando "coberto" de razão, aí impera o solve et repete, o acto de "destacar pelo picotado" toma uma eternidade. Ao longo da qual a hipótese da ruína nos surge especialmente provável.

Mas não era de ruína, o caso. Apenas o corolário de um pequeno episódio burocrático perfeitamente desproporcionado face ao também pequeno valor em causa (valor que o cidadão pretendia auferir em perfeita legalidade e que afinal - e em regras de elementar racionalidade gestionária, dessas que o leviatã manda reiteradamente às urtigas - acaba por não compensar o trabalho do cidadão para tanto; o do cidadão e o do leviatã. Mas esse tem batalhões de gente para tal efeito e convém ao menos dar-lhes um simulacro de utilidade).

E lá estava na cartinha, na cartinha deste tão republicano fisco, operado por cidadãos e decerto ao serviço de cidadãos, o cidadão identificado - diga-se que sem surpresa, pois tal fórmula lhe é academicamente conhecida de há muito e por ela está de há ainda mais tempo habituado a ser tratado - como "sujeito passivo".

Sujeito passivo

Viva a república!

 

Mais sobre mim

foto do autor

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Arquivo

  1. 2023
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2022
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2021
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2020
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
Em destaque no SAPO Blogs
pub