Livros
São velhos (terrível palavra, por cá), velhos de muitas décadas; têm frequentemente as marcas do desprezo, do longo abandono nas casas por "desmanchar" - onde foram mais encargo do que legado -, da humidade, do manuseamento sem cuidado, um mínimo de respeito. Não formam, manifestamente, conjuntos aceitáveis numa estante de alguém bem sucedido, pelos padrões decorativos - esses, os decorativos - que interessam. Diferentes entre si, encadernados uns, de lombadas pouco melhor do que arruinadas outros, todos ou quase francamente envelhecidos. Um ou outro resistiu melhor; mérito decerto da sólida encadernação. Alguns têm o que, creio, se chama "marcas de posse": dedicatórias, assinaturas, datas, sublinhados, anotações; nomes que nada me dizem, mas me merecem respeito. Muito. Mereceram eles, há tempo, respeito. Os nomes e os livros - ou gosto de assim pensar - e agora respeito-os eu.
Amigos ou conhecidos que nos alertam para o espólio de familiares que partiram, ou que apenas envelheceram, livros que vão "deitar fora se ninguém ficar com eles" - assim, nessas palavras - e "não quereríamos dar uma olhadela naquilo?". Foi assim, recentemente. E cada vez mais os alfarrabistas; que visitava bem esporadicamente e de quem a bizarria do tempo que se vive me fez cliente "online". E fez pior, deu-me vontade de o continuar a ser.
Vem isto a propósito dos dois que tenho em mãos por estes dias. Nem tão antigos quanto isso, afinal, mas a que só consegui chegar dessa forma. Um e outro com marcas de um passado digno, creio. E sofrido, tenho a certeza (é uma evidência, num deles). Fico feliz por lhes dar uma nova vida. Ou prolongar a que têm. E, quanto puder, com a consideração que merecem.